Por Raissa Pascoal | raissapascoal@gmail.com
A conversa sobre as narrativas e as representações que elas carregam gerou uma longa discussão entre os pesquisadores da Sessão Coordenada 7 – “Narrativas Jornalísticas: dos contratos de comunicação ao paradoxo da incomunicabilidade e do não dito”, coordenada por José Luiz Aidar Prado. Os integrantes da mesa só interromperam a discussão por conta do horário excedido.
Luiz G. Prado, na Universidade de Brasília (UnB), apresentou o artigo “Narrativas: representação, instituição ou experimentação da realidade?”. A proposta era questionar o que se chama de narrativas jornalísticas e quais os modos de construí-las.
Prado destacou três formas de narrativas: como representação, como instituinte da sociedade e como forma de experiência da realidade.
1- Como representação
Nesta classificação de narrativa, o professor trabalha a narrativa como “histórias que representam a realidade, as relações sociais”. Aqui, Serge Moscovici, psicólogo romeno, é citado para falar das representações como sistemas de valores, idéias e práticas, que nos permitem classificar, nomear e estabelecer uma ordem ao mundo.
As narrativas são a projeção virtual do mundo pelo discurso, através da linguagem. Prado usa o termo “empalavrar” para explicar que narramos em função de “estratégias comunicativas”. A narrativa tem sentido de uso e que realiza o efeito de mudança de estado. Essa intenção é atingida pelo jogo da linguagem. Prado exemplifica com as histórias contadas por uma mãe ao filho. O efeito pretendido é apaziguar a criança, fazê-la entrar no estado de sono.
2- Como instituinte da sociedade
As narrativas, nesta óptica, não representam nada, apenas instituem o real. Enquanto narramos, construímos o mundo. Prado cita Cornelius Castoriadis, expoente da filosofia francesa, que diz que o imaginário não é imagem de nada, não é a representação, mas aquilo que gera a realidade. Esta não é apenas física, mas também de tudo que é simbólico.
O professor português João Maria Mendes, também citado por Prado, diz que “a narrativa, mais que a linguagem, é o instrumento fundamental da constituição e instituição do mundo para o sujeito e sociedades humanas, e desempenha essa função antes mesmo de sua divisão em narrativa de realidade e narrativa ficcional”. Essa colocação foi criticada, posteriormente, por Mayra Rodrigues Gomes, integrante do grupo. “O problema é que [a narrativa] anteceda a palavra”, disse Mayra. A questão levantada pela pesquisadora é que a própria palavra já é uma narratividade do mundo. O isolamento de campo, ao qual a palavra é submetida, carrega-a de significado além do denotativo.
3- Como experimentação da realidade
As narrativas nos permitem experienciar o mundo. Hoje, a nossa experiência passa pelo mundo e interage com o senso comum. Prado diz que “as pessoas entram e saem constantemente do fluxo midiático, filtram referenciais da realidade e refazem o senso comum”.
José Luiz Aidar Prado, coordenador da Sessão, disse que para ele “analisar a narrativa como experiência da realidade, acrescenta muito mais e faz com que a narrativa tenha uma aspecto social mais relevante”.
Fernando Resende, da Universidade Federal Fluminense (UFF), expôs seu trabalho, fruto de seu doutorado. Com o título “O jornalismo e suas narrativas: as brechas do discurso e as possibilidades do encontro”, Resende problematiza a narrativa como lugar de produção de conhecimento no Jornalismo.
O pesquisador começou pelo processo de produção da narrativa, tomando a análise do “quem” e do “como”, ou seja, de quem fala e como fala. Ele citou exemplos de narrativas e tentou trazer algumas experiências e análise. A intenção era mostrar a relação do conteúdo com a forma e que o processo de produção jornalística está ligado ao fazer jornalístico.
Resende levantou pressupostos e hipóteses. Uma delas foi a de Paul Ricoeur, filósofo francês. Um discurso é um lugar onde o acontecimento se configura em sentido, através de processo que gera lacunas ao mesmo tempo em que se nutre dessas faltas. Para Márcia Benetti, o discurso jornalístico não é transparente, ele é pleno de possibilidades de interpretação. Unindo as duas hipóteses, tira-se que o leitor que completa essas lacunas e dá o sentido ao discurso.
O pesquisador da UFF discorreu sobre as narrativas midiáticas. Para ele, os estudos da linguagem têm um papel relevante à medida que recupera o que ficou apagado nos estudos da comunicação. Assim, a narrativa pode revelar valores, legitimações, representações e falas.
Por fim, as narrativas jornalísticas foram apresentadas como possuindo três níveis que devem estar presentes: “o quê”, “quem” e “com”. Os dois últimos níveis representam a forma da narrativa. Já “o quê” representa o conteúdo, importante para pensar o jornalismo. Isso torna o estudo da narrativa relevante para o estudo do Jornalismo.
Coordenador da Sessão, Aidar apresentou o seu artigo “Dispositivo midiático e modalização convocadora: a construção do ‘a mais’ em revistas segmentadas”. As revistas analisadas foram Men’s Health, Woman’s health e Claudia. Aidar discute sobre o enunciador que narra para que o enunciatário, que espera alguma coisa, evolua para uma situação melhor, consiga o “a mais” em sua vida, que é o ser, o ter, o saber e poder mais na vida.
Cláudia Lago apresentou o artigo “Nós e o diploma: representações no campo jornalístico”. Cláudia diz que “todos operamos em campos, que são construções conceituais que nós fazemos. São locais marcados pela lógica de disputa”. Para ela, as pessoas lutam para legitimar suas bagagens, suas formas de se colocarem no mundo.
A pesquisadora cita Pierre Bourdieu, sociólogo francês, que defende o uso cauteloso do que é proposto para o campo jornalístico. Para ele, o campo jornalístico, submetido à lógica de audiência, influencia outros campos, podendo exercer efeitos perversos.
A principal questão posta por Cláudia Lago, no entanto, é como as pessoas se organizam dentro da situação da queda do diploma. Ela analisou textos postados no Observatório de Imprensa por pessoas que se consideravam jornalistas, jornalistas profissionais com carteirinha, jornalistas profissionais sem carteirinha e outras profissões.
Os textos exprimem opiniões da maioria que são contra a queda do diploma, mas também de alguns a favor, que, segundo Cláudia, são de outros campos profissionais. A pesquisadora mostrou-se incomodada com o descomprometimento com os fins sociais das empresas e da contradição existente entre isso e o propósito do jornalista. “A empresa é um agente do capital, o jornalista é um paladino da defesa da democracia, no entanto, o jornalista, paladino da defesa da democracia, trabalha na empresa, agente do capital. Há um paradoxo nessas falas”.
Cláudia Lago também falou sobre o que legitima uma pessoa ser jornalista. Ela acredita nas características inatas, que é a vocação, mas também acredita na necessidade da passagem pela universidade para a formação humanística, espírito crítico e ética.
Cláudia diz que temos que refletir o Jornalismo no nosso campo acadêmico e refletir sobre os discursos que são colocados, porque as falas são representações que acabam chegando a ato. “Discurso não é só fala, porque discurso também vira ato”.
João Osvaldo Schiavon Matta, no artigo “A Boa Forma e o Orkut: “ecos” narrativos”, trabalha a questão do consumo. Pega de exemplo as revistas impressas que possuem os conteúdos ligados à questão do sucesso, do
corpo ideal, como é o caso da Boa Forma. Outro ponto levantado é a legitimação de ações, como dietas, que são legitimadas pelos discursos de celebridades.
O último artigo apresentado foi de Mayra Rodrigues Gomes, chamado “As representações nas revistas de negócios”. A pesquisadora começa dizendo que o Jornalismo é um grande esboço das relações de poder. Tomando três revistas para realizar o exercício, Época Negócios, Exame e Você S/A, a proposta é analisar todas as representações e o que elas tentam dizer. Como é o caso das vestimentas dos fotografados, o ângulo da foto, o ambiente, entre outros.
novembro 27, 2009
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